Cá estou para comentar mais uma adaptação literária. Uma família quase perfeita, é uma produção sueca inspirada na obra homônima de M. T. Edvardsson que estreou recentemente na Netflix. Para quem ainda não sabe, os livros do autor estão sendo publicados por aqui pela editora Suma. Uma família perfeita é o primeiro título da série Lundasviten que atualmente possui quatro histórias publicadas no exterior. Cada livro trás uma narrativa independente, e estão ligadas apenas por se passarem na cidade de Lund (belíssima por sinal, eu pesquisei). Por aqui já temos dois livros de Lundasviten disponíveis, são eles, Uma família quase perfeita e Uma tragédia familiar, primeiro e terceiro volumes respectivamente. Eu sou completamente apaixonada por suspense policial, e este vem com uma dose caprichada de drama familiar. Então já adianto que, mesmo curtinha, esta série tem tudo o que um apaixonado por histórias do gênero procura, muitos segredos, mentiras, personagens com caráter dúbio e um quebra-cabeças muito bem embaralhado.
Desde que comecei a acompanhar as publicações da editora Suma, tenho tido acesso a obras oriundas das mais diversas nacionalidades, antes disso, eu me limitava a consumir apenas literatura nacional e norte americana. Foi desta forma que eu tive a oportunidade de ler meus primeiros thrillers policiais Suecos, e consequentemente me surpreender com abordagens diferentes das que eu já estava acostumada. Li Uma família quase perfeita de M. T. Edvardsson, que inspirou esta minissérie há uns dois anos, e na época fui arrebatada pela narrativa impactante do autor, por isso, ver esta história ganhando as telinhas mundo a fora me causou uma satisfação enorme. Conhecer todos os segredos e saber como tudo se resolveria, me permitiu assistir a esta produção de forma mais crítica, e como todo bom leitor assistindo uma adaptação eu obviamente procurei por semelhanças e discrepâncias, e mesmo não tendo todos os detalhes fresquinhos em minha memória, me arrisco a dizer que o roteiro de Anna Platt e Hans Jörnlind, bem como a direção de Per Hanefjord (Agente Hamilton), fizeram jus a trama original.
Stella (Alexandra Karlsson)
1º TEMPORADA
Adam (Björn Bengtsson) e Ulrika (Lo Kauppi) possuem uma vida aparentemente perfeita. Ambos são bem sucedidos profissionalmente e amplamente respeitados pela comunidade da qual fazem parte, mas por trás das paredes da confortável casa em que residem existe muita sujeira empurrada para debaixo do tapete. Ulrika está bebendo desenfreadamente e mantém um caso extraconjugal que Adam finge não notar, já Stella (Alexandra Karlsson) a filha do casal está completamente destruída, a jovem nunca conseguiu superar completamente a agressão sexual que sofreu ainda na adolescência, principalmente porque seu estuprador saiu completamente impune, uma vez que seus pais optaram por não denunciá-lo. A decisão tomada com o intuito de evitar exposição e impedir que o desgaste do processo, que aparentemente não se sustentaria, causasse ainda mais danos a garota, deixou marcas profundas em Stella. Filha de um pastor exemplar e de uma advogada habilidosa, Stella parece não conseguir mais se encaixar nesta família "impecável", sua rebeldia e desinteresse a levam cada vez mais longe dos pais, que pouco sabem sobre seus sonhos, medos e desejos. Quando Stella é presa e acusada de assassinato, Adam e Ulrika lutarão desesperadamente, cada um ao seu modo, para salvar a filha. E no caminho irão pôr a prova sua credibilidade, suas crenças e seus valores, arriscando tudo o que construíram até então.
Ulrika (Lo Kauppi) e Adam (Björn Bengtsson) / Chris (Christian Sundgren) e Stella (Alexandra Karlsson)
É evidente que a ausência de diálogo é um dos principais responsáveis pela grande maioria dos problemas desses três. Adam não consegue falar, Ulrika não quer escutar e Stella fala mas não é verdadeiramente ouvida. Talvez uma conversa franca pudesse ter impedido que o drama familiar partilhado por eles escalasse para uma investigação de assassinato. O fato é, ser quase perfeito ainda é ser imperfeito. E é isto que eles são, humanos cheios de imperfeições, falhas de desvios. Quando Stella conhece Chris (Christian Sundgren), um homem bem mais velho, e começa a se relacionar com ele, fica claro o quanto ela é carente e imprudente. A jovem se lança nesta paixão e todo o resto fica em segundo plano, as poucas barreiras que ela sustenta são facilmente derrubadas e ela passa a orbitar ao redor dele. Neste meio tempo Adam e Ulrika permanecem completamente alheios a tudo o que a filha está vivendo. A única que está, superficialmente, por dentro da situação é Amina (Melisa Ferhatovic), melhor amiga de Stella que, embora conserve um pouquinho mais de juízo, demonstra sua lealdade protegendo todos os segredos da amiga. A morte brutal de Chris, é só a ponta do iceberg, Stella é de fato culpada? Se sim, por quê? O que lhe deu coragem para tirar a vida de um homem? E por que este homem?
Stella (Alexandra Karlsson)
Uma família quase perfeita possui uma trama magnética que te prende tanto pelo suspense quanto pelo drama. Confesso que em determinado momento eu estava mais interessada nos segredos, do que em descobrir quem de fato matou o Chris. A narrativa alternada entre os três pontos de vista evidenciou ainda mais os defeitos desta família. Poder olhá-los de dentro pra fora, sem a influência da opinião de terceiros me impossibilitou de gostar deles, óbvio que me solidarizo com toda a situação, mas não existe qualquer carisma em nenhum componente deste trio que justifique o afeto do espectador. Nem mesmo o Adam, que é um poço de virtude, foi capaz de conquistar meu carinho, ao contrário disso passei a desprezar sua postura curvada, sua voz chorosa e seus atos impulsivos que não condiziam em nada com quem ele deveria ser. A fraqueza do pai e a intransigência da mãe, respingaram na filha, que cresceu sem bases genuinamente sólidas. Stella é como uma folha solta ao vento, sua existência tem pouco ou nenhum propósito e os pais por não saber como lidar, simplesmente deixaram que ela voasse por ai sem direção. Para além do crime, e de toda a investigação, essa dinâmica familiar me deixou reflexiva. O desfecho, e a resposta pela qual esperamos todo o tempo, confirma diversos pontos implícitos no decorrer dos episódios. Em suma, esta produção apresenta uma narrativa de qualidade, boa execução e um plot digno.
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