Esta semana eu simplesmente não consegui cumprir com meu cronograma, nem hidratar o cabelo eu hidratei, acredita? Como de praxe, estou vivendo uma correria justamente no momento em que me falta disposição, minha preguiça de existir que lute. Então hoje, indo contra o que já havia planejado, vamos comentar A confissão de Agatha, mais um conto do Clube do Livro Sociedade das Relíquias Literárias, organizado pela editora Wish. Desde que fiz a leitura de A princesa coração de gelo, não consigo parar de pensar nas outras mais de quarenta histórias deste clube que eu ainda não conheço. E desde o instante em que finalizei a leitura de A confissão de Agatha, eu decidi que as lerei o mais rapidamente possível. Embora eu já tenha ouvido/lido maravilhas a cerca de algumas obras da Louisa May Alcott, eu simplesmente não estava preparada pra me apaixonar completamente por uma de suas histórias, e não apenas isso, me tornei uma admiradora ferrenha da sua escrita direta e cativante.
A confissão de Agatha (Thrice Tempted)
Coleção: Sociedade das Relíquias Literárias #044
Autor (a): Louisa May Alcott
Publicação: Wish
ISBN: 9788567566689 | Skoob
Gênero: Drama / Conto
Ano: 2023
Páginas: 40
Minha avaliação: 5/5★
A jovem Agatha se vê arrebatada, pela primeira vez, pela admiração de alguém. Entretanto, um dia, um olhar denuncia que aquela paixão agora seria concorrida. Uma amizade acabada, um amor em risco, uma confissão imperdoável. Agatha fará qualquer coisa para salvar seu relacionamento, mesmo que tenha que sucumbir a tentações diabólicas. A Confissão de Agatha, conto publicado em 1857, mostra um lado mais sombrio e eletrizante da autora que conquistou o mundo com Mulherzinhas.
Sempre que me proponho a ler um novo livro tenho por via de regra dosar as expectativas o máximo possível, e com A confissão de Agatha não foi diferente, pelo menos até eu iniciar esta leitura. Louisa sem sombra de dúvidas merece todo o destaque que conquistou, sua qualidade narrativa inenarrável nos aprisiona por completo e de imediato. O drama de Agatha me envolveu de tal maneira que passei a sentir na pele o medo, o desespero e a raiva que a protagonista alimentava dentro de si, era como se eu estivesse lá naquela casa assistindo ao vivo o desenrolar de todo imbróglio. E mesmo em uma história narrada em primeira pessoa, onde facilmente se pode duvidar da confiabilidade do narrador, a autora deixa indícios que podem guiar o leitor para uma interpretação menos tendenciosa. O desfecho me levou a um estado de êxtase e revolta, tal qual somente uma obra visceral é capaz de proporcionar. Mesmo agora, dias após ter lido este conto, eu me questiono até que ponto tudo ocorreu como descrito, e o que pode ter sido deturpado pela perspectiva limitada e distorcida da personagem.
Ilustração de Erica Nascimento
Agatha possui uma visão bem definida de si mesma, ela é uma mulher pragmática e está consciente de suas limitações. Ao se declarar pobre e simples, de pouco intelecto e personalidade, e desprovida de charme, ela alimenta uma perspectiva autodepreciativa que torna sua relação com Philip, o único homem que ousou amá-la, uma bênção ímpar e inesperada. Ela nunca acreditou que seria cortejada, então a chegada de Philip despertou dentro dela uma vitalidade que ela julgava não ser capaz de experienciar. Mas o amor, ainda mais um tão devoto, costuma trazer caos na mesma medida que um dia proporcionou deleite. E o inferno de Agatha começou no instante em que ela percebeu uma troca de olhares afetuosos entre Philip e Clara, sua "melhor amiga". Ao contrário de Agatha, Clara é rica, bela e astuta, sem sombra de dúvidas trata-se de uma mulher que pode obter facilmente tudo que deseja. Clara tem o mundo ao seus pés e mesmo assim ousou olhar para Philip, o único que Agatha tinha. Porque? Inicialmente a virtuosa Clara não teve qualquer pudor em declarar que tudo não passava de um joguete, Agatha não precisava se preocupar, pois não havia da parte dela qualquer interesse. Philip por outro lado, foi tomado pela lisonja de tal atenção e se viu enfeitiçado pela beleza da jovem.
Eu estava mergulhada de paixão e alma nessa paixão única que se apresentava a mim como um dia radiante de primavera em meio ao inverno. Eu a nutri e cuidei até se tornar a força regente do meu coração, guiando-me a fazer o bem ou o mal.
A constatação de que uma terceira pessoa estava se infiltrando propositalmente em seu relacionamento causou em Agatha uma infelicidade sem tamanho. Clara não era uma concorrente qualquer, e mesmo Philip, que dizia amar Agatha, confessou não ser totalmente imune aos encantos da jovem. Deste ponto em diante, as coisas se tornaram meio nebulosas, e foi meio impossível não questionar a veracidade de algumas situações. Já é de conhecimento geral que Agatha via o Philip como o suprassumo do que há de melhor na terra, então não foi difícil para ela colocá-lo como o pobre coitado da situação toda. Ela passou a enxergá-lo como a presa de Clara e lutou com tudo que pode para protegê-lo e mantê-lo longe da perversa mulher que queria conquistá-lo a todo custo. Na narrativa de Agatha todos os papéis já estavam bem definidos, e Clara era a vilã. Não nego que vendo tudo da perspectiva de Agatha, cheguei a sentir um certo desprezo pelas atitudes de Clara, mas em nenhum momento consegui aceitar o Philip como vítima.
A confissão de Agatha possui uma profundidade admirável. Indo além do óbvio, esta não é apenas a história de uma simples disputa amorosa, Louisa retrata de forma clara o desespero de uma mulher que acredita de forma insana que precisa casar para ser plenamente feliz. Não é apenas um desejo que surgiu com a paixão, é uma necessidade imposta e enraizada. Para Agatha, perder Philip é ceifar de uma vez por todas sua oportunidade de ter uma vida valorosa, deixá-lo partir é aceitar que irá murchar e secar na mais completa solidão, é um decreto de ponto final. Alcott descreve isso de tal forma que é possível ao leitor experimentar a sensação de morte em vida partilhada pela personagem, é doloroso e assustador. Acompanhar a enorme batalha travada por Agatha enquanto ela decide até onde pode ir para manter cativo o amor de Philip, me deixou consternada. Pondo em xeque sua moral, sua honra e sua consciência ela se deixa ser devorada por tudo o que há de pior e as consequências disto são catastróficas. Em suma, esta é uma leitura que eu recomendo sem reservas.
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